domingo, 28 de fevereiro de 2010

PERDIGÃO PERDEU A PENA...MAS NÃO A RAZÃO...

Inédito

Será pura coincidência o nome do personagem desta crónica confundir-se com o “Perdigão” dos versos de Camões. A única semelhança está no facto deste Perdigão também ter perdido a pena, não obstante ser uma figura real, de nome próprio e nosso contemporâneo.

O Perdigão que eu conheço atravessou os últimos três quartéis do século XX, assistindo, perplexo, a uma transformação profunda da sociedade, com a inversão completa de valores de 180º.O percurso da sua vida sofreu os atropelos e vicissitudes próprios das transformações das sociedades, em que há perdedores e vencedores injustos. Perdigão sentiu que toda a sua acção ia sofrendo interferências à medida que tentava construir o seu futuro honesta e meticulosamente. Os anos foram passando e a sua vida de projectos e ideais que admitia legítimos foi-se constrangindo e diluindo em decepções e frustrações.

Perdigão foi assistindo ao desmontar de valores que assimilara nos bancos da Escola com verdadeiros Mestres do Ensino e da Cultura. Sentiu-se impotente para enfrentar os tentáculos reformistas que o envolviam e manietavam. Os seus projectos deixaram de lhe causar expectativas positivas legitimamente criadas na adolescência. Tudo o que construiu e tentou resguardar das cobiças de terceiros, acabou por desabar e cair nas mãos dos noveis conquistadores. Fez várias tentativas para se reerguer e caminhar em frente, mas nunca lhe surgiram oportunidades válidas. As poucas vias que se abriram, depressa se fecharam, inviabilizando qualquer veleidade empreendedora, honestamente arquitectada. Razões estranhas e ocultas fizeram de Perdigão um simples espectador, não interventivo, da sociedade, retirando-lhe toda a apetência pela reconstrução da sua vida.

Na verdade, Perdigão foi perdendo a pena, mas manteve intacta a sua memória e a razão que nunca o abandonaram, antes, pelo contrário, foram-se avivando com o passar dos anos. Este é o único legado que Perdigão vai deixar aos seus descendentes, já que o seu património material se perdeu nas mãos dos injustos. Estes estão a ser julgados e continuam a ser justiçados pela Providência Divina.

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