CRÓNICA
LENDÁRIA
A canoa é
uma pequena embarcação africana, preferencialmente utilizada na pesca artesanal,
em águas muito próximas da costa. É de construção rudimentar pelo escavar de um
tronco, de madeira exótica leve e resistente. A canoa tem tradição em toda a
Costa africana, referindo-me, muito particularmente ao reino do N´Goio, hoje
conhecido por Cabinda, onde surgiu uma lenda que nos sensibiliza pela sua
origem e significado.
Em tempos
muito recuados, de há séculos, os povos africanos estavam muito virados para o
interior dos seus territórios e do próprio continente, onde se abasteciam dos
seus bens alimentares, consumindo particularmente caça, tubérculos e fruta,
além das pequenas culturas das suas lavras. Não tinham, portanto, uma relação
muito aberta com o mar.
No reino do
N´Goio, certo dia, uma mulher casada, de nome Micaela, cometeu adultério.
Reuniu o conselho da aldeia e o soba (chefe supremo da aldeia) resolveu
puni-la, mandando atá-la a um tronco de madeira flutuante, e abandonando-a no
mar largo, fora da baía. O homem, com quem ela cometeu o delito, desapareceu e
nunca mais foi visto.
Passados
largos meses, Micaela apareceu na baía dentro do mesmo tronco, em forma de
canoa e a remar. O facto foi tomado por todos como vontade dos Deuses que, para
além de a terem salvo, puseram nas mãos daquela gente um instrumento que
poderia introduzi-los na pesca. O soba voltou a reunir o conselho e resolveu
perdoar Micaela e o seu amante. Uma dúvida no entanto ficou no ar: não teria
sido o amante que teve a ideia de cavar o tronco e entregar o remo a Micaela
para se salvar? Dele nunca mais houve notícia. Para perpetuar o nome “canoa”, o
soba ditou que a partir daquele momento a baía passasse a chamar-se “Baía das
Almadias”. O navegador Ruy de Sousa ao aportar ali com as naus portuguesas,
pela primeira vez, em 1491, ficou surpreendido com o número elevado de canoas
(almadias) que navegavam na baía.
Desde então,
o povo do N´Goio e todos os outros limítrofes passaram a construir as suas
canoas e a dedicar-se à faina piscatória.
Os
cabindeses tornaram-se uns pescadores exímios, o que representou uma mais-valia
importante, pois passaram a fornecer peixe aos barcos que demandavam a costa de
Cabinda para se abastecerem também de frutas e água, além de fazerem permuta de
outros produtos coloniais por bens de consumo europeus.
Ruy Serrano –
13.03.2017
Sem comentários:
Enviar um comentário