quarta-feira, 17 de março de 2010

A QUITANDA



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Quitanda é a terminologia africana porque se alude ao mercado ou praça. Quitanda é mais que simples mercado ou praça onde se vendem bens de consumo. Quitanda é o Templo da convivência e dos cheiros e paladares africanos. É o ponto de encontro das forças vivas multirraciais da comunidade.

Esta introdução é obrigatória para transmitir ao leitor a importância da Quitanda a que estão ligados todos os cidadãos: os abastecedores e vendedores, os consumidores e os simples curiosos e visitadores. Vou referir-me em particular a Cabinda, realidade que eu vivi com muito prazer nos anos 40 a 60 do século XX. Era tempo de Paz, trabalho e progresso sem ameaças e sobressaltos. Aqui a Quitanda funcionava a céu aberto.

Os abastecedores, simultaneamente vendedores, eram as famílias africanas que levavam das suas lavras os produtos agrícolas como: bananas (maçã, ouro, macaco e outras), laranjas, tangerinas, ananases, abacates, cocos, fruta-pinhas, mamões, papaias e muitas mais e ainda o dendê para confecção da moamba. Da pecuária, apenas animais vivos como, galinhas e frangos, patos, cabritos e pombos verdes. A matriarca da família era quem tratava do cultivo e recolha dos produtos, enquanto que o seu homem se ocupava duma profissão extra-caseira. Os filhos mais velhos cuidavam dos mais novos e contribuíam para manter as suas casas limpas e asseadas, tendo a especial missão de as manter sem mato ou capim, num perímetro de 100 metros, para evitar os percalços das queimadas. Também eram abastecedores e vendedores, os pescadores que, ao terminarem a sua faina nocturna, apareciam bem cedo com os peixes mais variados como: a corvina, os malévos, a taínha, o carapau, o tubarão, os chocos, os polvos, os caranguejos, as lagostas, etc... Eles eram muito profissionais, pois enfrentavam por vezes o mar revolto, com coragem e determinação, em frágeis canoas (troncos de árvore cavados).
Os consumidores ficavam inebriados pelo colorido e aroma dos produtos, especialmente das frutas, comprando um pouco de tudo. Finalmente os visitadores eram simples curiosos que por vício se deslocavam à sua Quitanda para terem o prazer de compartilhar dos mesmos aromas e cores, a que se juntavam a variedade dos panos coloridos com desenhos apelativos, que as mulheres exibiam vaidosamente, envolvendo os seus corpos esculturais do peito ao tornoselo. Estas sensações agradáveis eram reforçadas pelo cheiro da forte maresia que vinha da baía e se mesclava com todo o ambiente do Templo. Eis a razão porque ao fim de tantos anos se sente com profundo sentimento a Saudade e o Feitiço Africanos.

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