sábado, 15 de outubro de 2011

COMO DEIXEI A MINHA TERRA

(INÉDITO)

Aproximava-se o dia da proclamação da Independência de Angola. Com o contencioso político de Cabinda por resolver, a minha apreensão pela paz e segurança aumentava na razão inversa do tempo que passava. Eu era confrontado, diariamente, com o assédio dos revolucionários sobre a minha permanência ou não na minha terra. Inversamente, exigiam que eu aderisse ao movimento pró-independência de Angola, que eu rejeitei.

Impunha-se tomar uma decisão que corria contra o tempo. Via passarem as semanas, os dias e um impulso repentino decidiu pela minha razão. Ainda hoje me interrogo por que motivo resolvi deixar a minha terra. Acho que na altura, o que imperou na minha decisão, não foi o medo, mas apenas a família que já se encontrava em Portugal. Todavia, acho que os perigos e privações por que poderia ter passado não teriam sido maiores do que as vicissitudes e humilhações a que viria estar sujeito em Portugal.

Seguiram-se noites de vigília alternada com sonos breves e a odisseia de encaixotar os meus objectos de uso pessoal que não podia abandonar. O maior recheio da minha casa ficou porque tencionava regressar logo as circunstâncias o permitisse. Para garantir a preservação dos meus bens domésticos e a manutenção da posse da minha casa, deixei a habitá-la um meu colaborador africano Cabindês. (Passados 6 meses foi desalojado devido à nacionalização dos meus bens). Por faltarem apenas 3 dias para a Independência, tornou-se difícil conseguir um lugar no avião de carreira da TAP. Ao embarcar para Luanda, passei pelo momento emocional mais complicado da minha vida, pois iria deixar a terra que me viu nascer, sem a certeza de que regressaria.

Em Luanda, à fome e à mercê da alta temperatura que se fazia sentir, aguardei um dia e uma noite por uma vaga no avião da TAP. A agravar a situação, um piquete do MPLA revistava a bagagem, recolhendo objectos, como rádios, artesanato, ouro e dinheiro. Tive a sorte de ser atendido pelo piquete das autoridades portuguesas que partilhavam a fiscalização. Apenas me preocupava o rádio Hitachi, minha companhia inseparável, que deixaram passar.

Por fim lá entrei no avião e, já em pleno voo, ainda deitei um último olhar emocionado a Luanda e às suas ilha e bela baía, antes de mergulhar num sono prolongado para recuperar das dezenas de horas perdidas a dormir com intermitências. O que me aconteceu em Lisboa, após a minha chegada, e as surpresas que os dias, meses e anos me aguardavam, ficam para relatar numa segunda crónica.

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