quarta-feira, 12 de outubro de 2011

MARINHA MERCANTE


(INÉDITO A PUBLICAR)

A marinha mercante portuguesa teve uma importância relevante na economia do País nas décadas de 40 a 70 do século XX. A marinha mercante abrange a marinha de comércio e a marinha de pesca. Vou apenas debruçar-me sobre a primeira, que era o único transporte de mercadorias e passageiros e de correio.

A marinha mercante comercial desempenhou sempre um papel fundamental na ligação entre Portugal e as suas províncias ultramarinas. A utilização dos meios aéreos só veio a tomar corpo na década de 50, embora o primeiro voo da TAP se tenha realizado em Dezembro de 1947. Os seus custos ainda eram elevados. Com a vulgarização deste meio de transporte e as independências dos territórios ultramarinos, Portugal abandonou a Marinha mercante ao puro ostracismo.

Esta introdução à minha crónica visa enquadrar o tema no momento que se vivia em Cabinda entre os anos 40 e 60. Nessa época, Cabinda dispunha apenas de um cais de acostagem de batelões e embarcações de pequeno calado. Os navios de carga ficavam fundeados fora da baía, por falta de calado e os produtos de consumo e passageiros eram transportados para a ponte cais, respectivamente, através dos batelões e lanchas. De retorno, recebiam da mesma forma produtos coloniais e passageiros.

Os navios eram exclusivamente de carga de bens e dispunham apenas de meia dúzia de camarotes para passageiros. Os barcos exclusivamente de passageiros, ditos paquetes, não escalavam Cabinda por o número de passageiros reduzido não o justificar. Entre Cabinda e Portugal e vice-versa, os barcos de carga faziam, esporadicamente, escalas pelos portos de São Tomé e Príncipe, Cabo Verde, Canárias (muito raramente) e Madeira. As viagens duravam de 3 a 4 semanas, consoante o estado do mar e do tempo. Aportavam Cabinda uma vez por mês, um ou dois navios, neste caso, quando se justificava, para receberem produtos coloniais, principalmente madeiras exóticas em toros e serrada.

O dia da chegada de um navio era efusivamente festejado por toda a população- A sua aproximação à baía assinalada pelo toque dos sinos do Palácio do Governo e da Capitania.situados em dois morros da vila. Adultos e miúdos, homens e mulheres, exultavam de contentamento porque iriam, ainda no mesmo dia, poder saborear a sardinha, o carapau, o queijo da serra, o bacalhau, as frutas e legumes e demais alimentos frescos. Todos este produtos eram importados e esgotavam durante uma parte do mês, até chegada de nova remessa. A alfândega, por vezes, trabalhava noite dentro para desembaraçar os produtos alimentares acabados de chegar. Os colonos também aguardavam sofregamente as cartas das famílias e comerciais que só chegavam de mês a mês, às quais respondiam para seguirem no mesmo barco.

A garotada, amigos inseparáveis das brincadeiras, brancos, pretos e mulatos, corria em competição, em direcção ao palácio, para poder contemplar a entrada do navio na orla da baía. Iam divisando no horizonte, em crescendo, o mastro, seguido do convés e terminando no casco do navio até à zona da água.É uma imagem única que ainda hoje guardo com agrado na minha retina e que me faz reviver os momentos simples da vida de então, comparados com os momentos complexos de hoje.

De facto, actualmente, Portugal só ficou a perder com o abandono da marinha mercante, tanto de comércio como de pesca, que poderia contribuir sobremaneira para o crescimento económico do País, não só pela produção de riqueza como pela criação e manutenção de postos de trabalho. Bastava ter-se convertido os navios em porta contentores para utilização do País e eventual angariação de fretamentos.


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