domingo, 12 de junho de 2011

FATY - A BELA MESTIÇA

(PUBLICADO EM 27/07/2007,

NA CIDADE DE TOMAR)

Faty era uma mestiça diferente, de uma beleza estonteante, com o condão de seduzir por encantamento natural. Tinha apenas 17 anos. Ao fim da tarde, quando o Sol, cansado, mergulhava, avermelhado, nas águas da baía daquela praia equatorial, a silhueta de Faty projectava-se nas águas cristalinas do mar, cujas ondas revoltas, se desfaziam, violentamente, de encontro aos rochedos que ornavam a orla marítima. Faty equilibrava-se, sobre os rochedos, descalça, de calções curtos e blusa decotada, como que ensaiando uma dança exótica e excitante. A tonalidade da sua pele confundia-se com o castanho claro dos rochedos. O seu rosto, acetinado, era longo e bem composto por um nariz fino, olhos rasgados de gazela, protegidos por longas pestanas e orelhas harmoniosas. O cabelo liso, apanhado ao alto, formava um carrapito bem composto e preso por um laço dourado. Faty tinha consciência da sua beleza, pelo que usava a sedução para se tornar alvo da cobiça dos homens que a disputavam com desassossego e impertinência.
Nessa disputa, inconsequente, pela sua posse, resultavam dissidências permanentes entre os seus admiradores, entre os quais se destacava um jovem, de nome, José, de raça branca. Este foi o eleito por Faty, não porque conseguisse competir com a sua beleza, mas tão-somente porque José tinha apenas 18 anos e pertencia a uma das melhores famílias de colonos da comunidade, com algum património e de estatuto reconhecido.
José foi, naquele fim de tarde, como habitualmente, encontrar-se com a sua primeira e grande paixão, na praia do farol, como era conhecida, por ter um farol de sentinela e aviso à navegação. Faty esperava-o mais atraente que nunca: provocante e meiga proporcionava a José momentos deliciosos de prazer e fantasia que, por serem novidade e surpreendentes, pareciam irreais. Durante semanas juraram, mutuamente, amor eterno, com promessas imaturas e inconcretizaveis. Corriam ao longo da praia, ora por cima dos rochedos, ora nas areias quentes e extensas; enrolavam-se, entrelaçados, no areal, beijavam-se ardentemente e acabavam por contemplar as ondas que se agitavam, convulsiva e ferozmente, rebentando, com fragor, na praia, envolvendo os seus corpos em espuma branca.
Faty sentiu-se tentada a mergulhar naquelas ondas traiçoeiras, não obstante os avisos e esforços constantes de José, procurando dissuadi-la de tal propósito, por se tornar deveras perigoso. Aquela praia já havia sido cenário de vários afogamentos e por isso não era aconselhável tomar banho em determinadas ocasiões como aquela em que o mar estava demasiado agitado e com redemoinhos.
Assaz teimosa, Faty insistiu e irrompeu mar adentro, como que procurando libertar-se de algo que a atormentava. Conseguiu vencer várias ondas ameaçadoras, pela sua força e volume, mas afastando-se cada vez mais da praia. A dado momento, sem qualquer reacção da sua parte, Faty desapareceu no mar, deixando José pregado ao chão, atónito e incrédulo com a crueza do desfecho inesperado, em que ele se tornou impotente para poder valer à sua amada. Depois de voltar à realidade, José teve um momento em que pensou seguir a sua amada, mas alguém se aproximou dele e lhe deitou a mão, impedindo-o de tal loucura. Era o seu inseparável protector e zelador da sua casa, o africano Zacarias, que o seguiu desde casa e o vigiava, a mando de sua mãe, para o resguardar de qualquer imprevisto, sabendo que haviam mais interessados na bela Faty.
Este desgosto, por ter sido o primeiro da sua vida, manifestou-se tão inesperado e violento que deixou José marcado para sempre, concluindo, ainda, na flor da idade, que não valia a pena sonhar, por o futuro ser tão imprevisível e enganador. Ainda hoje, José se interroga do motivo que levou Faty a procurar, voluntariamente, uma morte tão trágica, levando consigo, para a Eternidade, o seu segredo.

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