domingo, 19 de junho de 2011

SÃO BENTO

(INÉDITO)

No Portugal profundo vive uma comunidade isolada do Portugal moderno. Do Mundo apenas chegam rumores e informações confusas difíceis de decifrar e compreender, porque são questões marginais ao quotidiano da comunidade. O lugar é imaginário mas comparável a muitos outros lugares reais.
Nesse lugar, o mais velho, conhecido por Zé, é o conselheiro e ouvidor da comunidade. Todos lhe dão atenção e obedecem, à excepção de seu primo Manel. Este é de espírito inconformista, porque pelos rumores que lhe chegam, para além da sua comunidade, a vida é mais farta e livre, sem limitações de toda a espécie como acontece na sua terra. Chegou-lhe aos ouvidos que lá na Capital, em Lisboa, existe um Santo milagroso, conhecido por “São Bento”. Por descargo de consciência foi ter com seu primo Zé e perguntou-lhe:
- já ouviste falar no São Bento de Lisboa? Dizem que é milagreiro e nos trata de todos os males, principalmente os do nosso bem-estar, acabando-nos com a fome e as privações porque passamos.
Respondeu-lhe o Zé, fazendo o habitual manguito:
-olha, eu já estou tão escaldado com essas promessas, que não acredito em nada dessas histórias. Por isso tira daí o sentido e não dês ouvidos ao que dizem.
O Manel, teimoso como sempre e não querendo acatar o conselho do seu primo Zé, resolveu quebrar as regras da terra e ir ter com São Bento para encontrar o remédio para os seus males. A viagem para Lisboa foi atribulada porque passou por quatro tipos de transporte: o burro que o conduziu através do alcantilado das serras, até apanhar uma boleia para a localidade mais próxima. Aqui tomou a camioneta para a primeira estação de caminho de ferro donde seguiu de comboio para Lisboa.
Chegado à Estação de Santa Apolónia, dirigiu-se a um taxista e pediu-lhe para o levar a São Bento. O taxista, não se conteve e disparou-lhe uma pergunta à queima roupa:
- então, vem até à Capital conhecer São Bento?
- sim; ouvi dizer que as sessões são muito concorridas e deixam-nos confortados com os temas espirituais tratados. – responde Manel muito convicto.
- faço votos para que tire bom partido da sessão a que vai assistir. – retorquiu o taxista.
Enfim, o táxi parou defronte do Edifício da Assembleia da Republica e despejou aquele ocupante estranho. Entretanto, peço desculpa ao leitor por terminar aqui esta história. Tanto o taxista como eu perdemos definitivamente o rasto do Manel. Não sei exactamente o que lhe aconteceu, mas presumo que tenha regressado ao seu povoado e refúgio natalício desiludido e resignado com o seu destino já há muito traçado.



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